top of page

Para entender as 

NEURODIVERGÊNCIAS

Doutor Alexandre Valverde, Psiquiatra & Neurodivergente, fala sobre o diagnóstico tardio do autismo, a importância de  entendermos as características desta condição, e a necessidade de mais narrativas para a representação e identificação desta comunidade. 

  • TikTok
  • LinkedIn
  • Instagram
VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO, E PERTENCIMENTO NÃO É UM SONHO DISTANTE
Dr Alexandre Valverde sorri descontraidamente.

CRM 107.660 - SP

ANTES DE TUDO: NEURODIVERGÊNCIA NÃO É DOENÇA; É

UMA CONDIÇÃO

O QUE É NEURODIVERGÊNCIA?

AUTISMO &
ALTAS HABILIDADES

NEM TODO AUTISTA É SUPERDOTADO, E NEM TODA PESSOA SUPERDOTADA É AUTISTA. 

AUTISMO & MATERNIDADE

GRAVIDEZ E MATERNIDADE SÃO VIVIDAS POR PESSOAS NEURODIVERGENTES DE FORMA MUITO DIFERENTE DAS NEUROTÍPICAS.

DIAGNÓSTICO TARDIO 

UM SENTIMENTO MUITO MENCIONADO POR AUTISTAS QUE RECEBEM O DIAGNÓSTICO TARDIO É O DE ALÍVIO: "PELA PRIMEIRA VEZ, TUDO FEZ SENTIDO". 

O QUE É NEURODIVERGÊNCIA?

Por serem tão incompreendidas e constantemente expostas a situações de sobrecarga devido à hipersensibilidade sensorial, cognitiva e emocional, pessoas neurodivergentes enfrentam muito mais stress no dia a dia do que as neurotípicas. 

Em primeiro lugar, a neurodivergência não é uma doença – é uma condição. Em termos gerais, é uma variação natural no desenvolvimento do cérebro em que algumas funções podem tornar-se hiperdesenvolvidas (mais do que o padrão considerado típico) ou subdesenvolvidas (menos do que normalmente ocorre). O nome fala por si: é um tipo diferente de cérebro.

Sob o guarda-chuva neurodivergente está o espectro do autismo, TDAH, DDA, TOC, Dislexia, Discalculia e Síndrome de Tourette. Existe um componente genético nisso, embora alguns neurocientistas, como o médico Gabor Maté, argumentem que a neurodivergência é uma resposta neurobiológica adaptativa ligada ao stress parental e ao trauma transgeracional não resolvido. Voltaremos a esta teoria mais tarde.

Indivíduos neurodivergentes podem apresentar diferenças significativas no processamento sensorial, cognitivo, emocional e social, o que altera a forma como processam a comunicação, sentem e reagem aos estímulos. Por serem grosseiramente incompreendidos e constantemente expostos a situações que para eles são esmagadoras devido à  sensibilidade sensorial, cognitiva ou emocional (ou mesmo todas ao mesmo tempo), os indivíduos neurodivergentes enfrentam muito mais stress em seu cotidiano do que os neurotípicos. 

Os níveis de rejeição e crítica que experimentam regularmente também são altos, tornando muito comuns co-ocorrências como depressão, ansiedade generalizada, transtorno de pânico e fobia social.

Como não é uma doença, não existe cura -- embora muitos indivíduos possam se beneficiar de medicamentos para ajudar com os sintomas psiquiátricos decorrentes de suas dificuldades sensoriais, cognitivas e emocionais.

O que é neurod.

CARACTERÍSTICAS COMUNS

Seus desafios e pontos fortes variam enormemente e as experiências de cada pessoa são únicas. Mas existem algumas características em comum.  

Diagrama circular mostrando as características em comum das pessoas neurodivergentes: dificuldades no controle de impulsos, comunicação, hipersensibilidades sensoriais, socialização, funções executivas, forte reconhecimento de padrões, interesses intenso e respostas emocionais aumentadas.

Pode-se dizer que pessoas neurodivergentes têm uma forma original de pensar e que são altamente criativas. Suas contribuições em diversos campos da sociedade são valiosas e inovadoras. Elas formam um grupo heterogêneo com desafios e talentos muito diversos, mas com algumas características em comum: a comunicação atípica, a hipersensibilidade a estímulos (ruídos, luzes, cheiros, toque e texturas), diferenças no funcionamento executivo, respostas emocionais aumentadas e hábeis no reconhecimento de padrões.

Em relação ao funcionamento executivo – os processos cognitivos que nos permitem planejar, organizar, iniciar e concluir tarefas – as pessoas neurodivergentes podem ter dificuldade de organização, gestão do tempo e controle de impulsos. 

As interações e relacionamentos sociais também podem ser uma fonte de ansiedade devido à dificuldade de compreender as normas sociais, interpretar a linguagem não-verbal ou manter conversas recíprocas -- é comum falarmos sem parar, sem dar chance do outro responder ou comentar, interromper o outro, ou então ficar totalmente calados, sem saber o que dizer em contextos sociais. 

Demonstrar intenso interesse, entusiasmo e profundidade de conhecimento em alguns tópicos ou atividades é um traço comum das pessoas neurodivergentes. Muitas têm habilidades excepcionais em diversas áreas, além de um olhar extremamente atento a detalhes. 

Comportamentos de autoestimulação motora como o stimming (movimentos ritmados e repetidos de partes do corpo, do corpo todo ou feito com pequenos objetos como canetas, elásticos, anéis, etc.), o fidgeting (movimentos pequenos e muitas vezes involuntários que demonstram inquietação) e a ecolalia (repetir sons, palavras, frases de pessoas, filmes ou músicas, em voz alta ou em pensamento) são eficientes estratégias de autorregulação sensorial ou emocional também muito comuns. 

Altas Habilidades

AUTISMO E ALTAS HABILIDADES

Existe uma variação significativa na forma como o autismo e a superdotação se manifestam em diferentes pessoas. A tarefa de identificá-las e apoiá-las requer uma compreensão aprofundada dos seus pontos fortes, desafios e necessidades individuais. 

Muitos estudos sugerem que pode haver uma sobreposição entre autismo e superdotação, com características comuns como o hiperfoco, a atenção aos detalhes e altas habilidades em áreas específicas. Contrariamente à crença popular, no entanto, estas habilidades são observadas não apenas na matemática, na tecnologia ou nas ciências, mas também podem se manifestar em áreas como o esporte, a música e as artes, nas quais essas pessoas se destacam muito. 

É fundamental lembrar que o espectro do autismo é altamente diversificado e não existem dois indivíduos idênticos, seja no autismo, na dislexia, no TDAH ou na superdotação. Tanto os pontos fortes como as dificuldades de cada condição variam muito de pessoa a pessoa, sendo também o caso das pessoas superdotadas ou com altas habilidades. 

Nem todos os autistas são superdotados, e nem todos os indivíduos superdotados são autistas. No entanto, cada vez mais estudos sugerem que uma elevada proporção de autistas pode apresentar capacidades excepcionais em alguma área. Por outro lado, alguns indivíduos superdotados também podem apresentar características associadas ao autismo, como dificuldades sociais, sensibilidades sensoriais ou padrões atípicos de comunicação.

Ter habilidades excepcionais não está necessariamente ligado a um QI (quociente de inteligência) mais elevado, uma vez que este tipo de teste mede apenas o raciocínio lógico-matemático, sem considerar a habilidade artística ou esportiva.

A ligação entre autismo e superdotação é um tópico de pesquisa e debate contínuos. Sabemos que ambos são conceitos abstratos complexos e multifacetados, e que cada indivíduo é único. Existe uma variabilidade significativa na forma como se manifestam em diferentes pessoas, e a tarefa de identificá-las e apoiá-las requer uma compreensão aprofundada dos seus pontos fortes, dificuldades e necessidades individuais. Mais pesquisas são necessárias para explorar esta conexão e suas implicações para a avaliação e apoio daqueles que são autistas e superdotados.

​

Maternidade

AUTISMO & MATERNIDADE

Ser uma grávida autista significou sentir tudo demais: desde cheiros nauseantes, inchaço absurdo, sonolência incontrolável, sudorese pós-parto, mamilos fissurados e alergias à costura da cesariana, até ansiedade galopante, pensamentos catastróficos e depressão paralisante. E, para meu desespero, uma solidão horrorosa. 

Por Kika Salvi

Pessoas autistas podem enfrentar desafios únicos na gravidez, como o aumento nas sensibilidades sensoriais, diferenças na tolerância à dor, sentir-se incompreendidas ou julgadas por profissionais de saúde, e pouco à vontade para fazer perguntas. O cuidado que recebem é insuficiente para as suas necessidades, e a ansiedade sobre revelar o seu autismo é grande devido ao potencial estigma. Isso tudo pode aumentar ainda mais o stress da sobrecarga sensorial, emocional e cognitiva da gestação, aumentando os riscos de  meltdowns, shutdowns, partos prematuros e bebês com baixo peso. Os profissionais de saúde falham em reconhecer as necessidades físicas e emocionais de gestantes autistas. 

Assim como em muitas outras circunstâncias da vida, a gravidez e a maternidade são vivenciadas por autistas de maneira muito diferente em comparação aos neurotípicos. A gravidez pode ser especialmente complicada devido à hipersensibilidade sensorial, déficit motor, dificuldades interoceptivas, distúrbios do sono e afetivos, além de um extremo apego às rotinas. A gravidez e a transição para a parentalidade são marcadas por mudanças biopsicossociais significativas, representando um período crítico na trajetória da saúde adulta, com a emergência de fatores de risco que vão influenciar a saúde ao longo da vida.

Sendo uma mulher autista, a gravidez e o pós-parto significaram, no meu caso, sentir tudo intensamente: desde cheiros nauseantes, inchaço absurdo, sonolência incontrolável, mamilos fissurados, sudorese noturna e alergia à costura da cesariana, até ansiedade desenfreada, pensamentos catastróficos e depressão paralisante. E para meu desespero, uma solidão horrorosa. 

Não senti que a equipe médica de fato respondeu minhas perguntas, ao menos não em detalhes nem com a objetividade que eu precisava, nem levou a sério meu sofrimento físico e emocional. “É depressão pós-parto”, diziam, com desdém. Mesmo tendo planejado a gestação e me sentindo totalmente apaixonada por minhas bebês, morri de vergonha de mim mesma e dos outros por não estar feliz. Longe disso: eu me sentia tão infeliz e sem esperança que meus pensamentos eram constantemente suicidas. O maior sentimento de todos? Culpa. Então fingia, da melhor forma que podia, que estava tudo bem. 

Não poder dormir, não ter mais o meu silêncio sagrado e a constante falta de privacidade (já que sua vida é invadida por visitas desde o primeiro dia após o parto -- o que é insano!) foi a parte mais extenuante para mim. Mas como ninguém tinha mencionado o quão difícil a maternidade podia ser, não me queixei. Por mais de um ano, vivi silenciosamente uma das piores depressões da minha vida. 

Sobrevivemos àquela tempestade que durou mais de um ano, eu e minhas filhas, à época do nascimento de cada uma delas. Mas não sem algumas sequelas para todas. As experiências cotidianas da maternidade são importantes demais para ser ignoradas, e hoje sabemos que são críticas para a saúde física e mental de todos os envolvidos. Estas interações do começo da vida têm impactos duradouros no desenvolvimento da criança, nas dinâmicas do casal e atmosfera emocional da família como um todo. Tudo isso precisa ser dito. Precisamos ser educados sobre neurodivergências. Não é possível que tantos de nós passem por experiências tão traumatizantes sem apoio e esclarecimento. Precisamos de Psicoeducação acessível e de qualidade, que antecipe e prepare nosso corpo e nossa mente para as mudanças profundas da maternidade; para que uma experiência tão sagrada não se perca em confusão e sofrimento, e possa ser vivida plenamente. 

​

Diagnóstico Tardio

DIAGNÓSTICO
TARDIO 

Tal como acontece com tantos tópicos da Psicoeducação, teríamos a oportunidade de viver muito melhor se aprendêssemos a identificar traços de autismo desde cedo.  Hoje em dia, cada vez mais adultos recebem um diagnóstico tardio, o que causa sentimentos contraditórios que vão desde a tristeza pelo que foi perdido devido à desinformação, até à compreensão de quem de fato somos e à auto-aceitação. O sentimento mais citado por autistas tardiamente diagnosticados é de alívio: pela primeira vez na vida, parece que tudo faz sentido.

O diagnóstico tardio é sempre libertador. Ele esclarece muitas das dificuldades que autistas não-diagnosticados enfrentam ao longo da vida em termos de sentimentos intensos, comportamentos incomuns, percepções e reações diferentes do que seria esperado num mundo neurotípico. É um momento de validação das experiências de vida, pois o diagnóstico ajuda a explicar o constrangimento em interações sociais, a comunicação atípica, a extrema carga emocional, as hipersensibilidades sensoriais e tantos aspectos da experiência como autista. Esta compreensão reduz sentimentos de confusão, vergonha, culpa e insucesso.  

“Sempre senti que não pertencia”, diz a maioria dos autistas adultos. Além de clareza, o diagnóstico também traz a oportunidade de encontrar uma comunidade de semelhantes, com desafios e histórias semelhantes. Esta conexão promove o sentimento de pertencimento, de compreensão e apoio mútuo -- tão raros para as pessoas do espectro. Permite ainda o acesso a serviços, terapias e recursos voltados às suas necessidades, como intervenções comportamentais, treinamento de habilidades sociais, terapia ocupacional e fonoaudiologia, além da possibilidade de adaptações educacionais e laborais quando necessárias. Isto pode incluir modificações nos ambientes de aprendizagem, tempo adicional para tarefas ou testes, adaptações sensoriais e ajustes no local de trabalho para promover o bem-estar e permitir o sucesso profissional e acadêmico. 

​

​

​

O diagnóstico ajuda na reinvenção da própria vida e na autoaceitação, facilita a compreensão do passado e das dificuldades atuais, e reduz sentimentos de confusão, vergonha, culpa ou insucesso. 

Indivíduos autistas recém-diagnosticados e suas famílias podem acessar informações para entender melhor a condição, além de serviços de capacitação, terapias e os diferentes tipos de intervenção disponíveis hoje em dia. Ou seja: mesmo que o diagnóstico tardio possa causar sentimentos contraditórios e intensos, também pode proporcionar clareza, validação, acesso a serviços especializados, oportunidades de crescimento e de conexão humana. 

Diagnóstico Tardio
bottom of page